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HOBBY DE MÉDICO
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Washi
A médica de ascendência nipônica Nelza Shimidzu é uma das poucas pessoas que produz no Brasil o washi, papel artesanal japonês feito à base de fibra de plantas. Largamente utilizado no mundo até a introdução do papel industrializado, o washi teve seu auge no século 18, quando aproximadamente 100 mil famílias no Japão trabalhavam na sua produção. Em um sítio em Cesário Lange, a 140 quilômetros da capital paulista, Nelza cultiva o kozo, uma das três plantas originárias do Japão que fornecem a matéria-prima para o washi – os outros dois são gampi e mitsumata. O papel de gampi é considerado nobre; o de kozo, forte; e o de mitsumata, delicado.
Neuza Shimidzu
O kozo foi introduzido no Brasil pelas mãos do imigrante oriental, Koichi Matsuda que trouxe a árvore ao país no final na década de 80, aproximadamente. Koichi fazia isso para preservar a cultura de seu país entre os integrantes e ascendentes da comunidade japonesa no Brasil. Foi o médico e amigo Tsuyoshi Yanashita que apresentou Nilza a Koichi Matsuda, que na época tinha publicado um livro sobre washi. Ele era paciente de Tsuyoshi.
Nelza adquiriu de Koichi 200 mudas de kozo que foram plantadas em seu sítio em Cesário Lange. Apenas nove vingaram. “Por ser originário do Japão, o kozo teve uma adaptação difícil, mas hoje minha plantação tem mais de 200 pés e cresce como mato” brinca. No mesmo sítio a médica tem o ateliê de processamento de papel. Antes de conhecer Matsuda, Nelza já havia feito dois cursos de produção de papel artesanal – o primeiro, em 1987, com a artista plástica chilena Stella Rodas, no Liceu de Artes e Ofício; e outro pela Aliança Cultural Brasil/Japão.
Formada em 1980 pela Universidade Federal de São Paulo-Unifesp/EPM e especialista em saúde pública, Nelza trabalha no Hospital do Servidor Público Estadual em São Paulo. Sempre que pode, está no ateliê em Cesário Lange para cuidar da produção de washi. Ela diz que consegue conciliar muito bem as atividades de médica e artesã, nisso conta total apoio das duas filhas e do marido, que também é médico.
A produção de washi começa no inverno, em julho, período de desfolha do kozo. Nelza tem três ajudantes que auxiliam no corte da árvore. Depois, a médica faz a vaporização dos caules colhidos para tirar as cascas. A vaporização separa a matéria prima do washi. A primeira e a segunda camada do caule não são aproveitadas. A terceira, uma casca branca, é retirada com cuidado e cozida em solução alcalina até que as fibras se separem totalmente. As fibras cozidas são abertas com martelo e, após a lavagem intensa, transformam-se em uma polpa. “Qualquer sujeira compromete a qualidade do papel”, adverte Nilza. Depois, a fibra é colocada em um recipiente com água e dispersante – é nessa fase que a polpa transforma-se na base do papel. Depois essa base é recolhida da água com uma espécie de peneira e transferida para uma tela de secagem. Todo esse processo demora em média uma semana, dependendo da quantidade do papel. O washi é muito procurado por restauradores de livros. “Como é muito fino e resistente, sua folha adere ao papel danificado sem comprometer a leitura”, explica Nelza.
O washi foi muito utilizado para a impressão de textos sagrados budistas – os sutras. Nas residências japonesas é comum encontrar biombos, papéis de parede e luminárias de washi. Também é muito procurado para a confecção de origamis (mini escultras de papel) e chigiri-e (técnica de colagem com pequenos pedaços de papel que resultam em desenho em relevo). A produção de Nelza, em geral é utilizada por artistas, artesãos e restauradores de livros. “Sempre para o bem e nunca para matar ninguém”, brinca a médica referindo-se ao episódio ocorrido durante a Segunda Guerra Mundial, quando o governo japonês convocou todos os produtores de papel do país, que confecionaram nove mil balões de washi para transportar bombas ao Estados Unidos. Cerca de mil balões chegaram ao seu destino, provocando mortes e incêndios.
Ao participar de um seminário sobre parasitose em Tókio, Nelza aproveitou para conhecer uma oficina de papel japonês. “A técnica é um pouco diferente da minha. Eles usam uma tela de bambu que facilita a distribuição de fibras, deixando o papel mais fino e resistente”. A médica pretende adquirir a tela. “Quero praticar a técnica com a qualidade oriental e passar o conhecimento adiante”, revela.