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Edição 33 - Outubro/Novembro/Dezembro de 2005

ACONTECE

São Paulo ganha mais um Niemeyer


Novo auditório do Ibirapuera conclui projeto engavetado por 50 anos

Concebido pelo arquiteto Oscar Niemeyer há mais de 50 anos, o Auditório Ibirapuera foi finalmente inaugurado em 6 de outubro último, depois de muita polêmica em torno da retomada do projeto. Com capacidade para 800 pessoas, a nova sala de espetáculos faz parte do conjunto arquitetônico do Parque Ibirapuera projetado por Niemeyer para os 400 anos de São Paulo, celebrados em 1954.

O arquiteto carioca de 98 anos acompanhou pessoalmente as adaptações ao projeto original e toda a construção foi feita sob a supervisão de seu escritório de arquitetura. Uma engenhosa porta guilhotina de 20 metros – que não fazia parte do antigo projeto – permite a inversão do palco.  “A utilização do auditório pode se estender a espetáculos de música programados para realização externa e interna”, comentou Niemeyer, ao explicar a função da porta guilhotina. Logo na entrada principal há uma escultura do próprio Niemeyer, chamada  “Labareda” e, no hall um pouco à frente, outra da artista plástica Tomie Ohtake, intitulada “Chama”. O falecido arquiteto franco-suíço Le Corbusier, chegou a ser convidado na década de 50 para elaborar duas pinturas para o auditório projetado em 1951.

Niemeyer não conseguiu que a Oca e auditório fossem interligados por uma extensão da marquise, semelhante à prevista no projeto original.  Para ele esse conjunto representaria um desenho simples e puro. Segundo o artista plástico e professor de arquitetura da Unicamp, Marco Do Valle, Niemeyer fez quatro projetos para o auditório em momentos diferentes nos últimos 50 anos. A proposta original previa uma laje plana, com a face triangular para baixo. No projeto atual, o volume foi invertido. Amigo pessoal do arquiteto carioca, Do Valle fez a tese de doutorado  “Desenvolvimento da forma e procedimento de projeto da obra de Oscar Niemeyer de 1935 a 1998”. Em 1953, a Comissão do IV Centenário da cidade decidiu que não construiria o auditório. A hipótese levantada por Do Valle seria falta de tempo para concluí-lo até a festa dos 400 anos.  As discussões sobre a construção foram retomadas várias vezes nos últimas 50 anos, mas nunca de forma efetiva. Em 2003, a então prefeita Marta Suplicy retomou a idéia, mas encontrou resistências. A resolução de tombamento do Parque proíbe novas construções para preservar a permeabilidade do solo. A obra também iria alterar o conjunto arquitetônico do Ibirapuera que já havia sido tombado pelo Condephaat. Depois de muitas batalhas jurídicas, as obras foram finalmente iniciadas em 2004.

O novo espaço abriga shows musicais e espetáculos teatrais, além de aulas de música. Os espetáculos externos são gratuitos e acontecem nas manhãs de domingo; os internos são pagos. No subsolo funciona a Escola do Auditório, de aperfeiçoamento musical para crianças e adolescentes da rede pública. O projeto é uma parceira da Prefeitura de São Paulo com a  TIM Brasil.
Em sua biografia, Niemeyer menciona pouco das obras realizadas em São Paulo, mas sua presença é representativa. O professor Do Valle considera o conjunto do Parque do Ibirapuera e o Memorial da América Latina as duas obras fundamentais do estilo Niemeyer na cidade porque foram “feitas para ser vistas”, ao contrário de outros edifícios do arquiteto, que ninguém sabe ao certo quantos são.

Dos sete prédios previstos no projeto do Conjunto Ibirapuera, foram edificados os pavilhões das Indústrias (da Bienal) , das Nações (antiga sede da prefeitura),  dos Estados (Museu de Arte Moderna-MAM), o das Artes (Oca) e da Agricultura (Detran). Com exceção do Detran, os demais seriam interligados por uma marquise em formato de tentáculos, que foi reduzido ao  de caminho sinuoso.

Clássico

No Ibirapuera projetado em 1951, ele sinaliza para uma nova fase, a dos pilares em V, comenta Do Valle, além de recorrer às rampas e construir a primeira cúpula (a Oca) que, posteriomente, seria redesenhada de forma invertida no projeto do Congresso Nacional em Brasília. “O Memorial, inaugurado em 1989, representa o retorno a uma grande obra no Brasil, onde, mais uma vez, ele demonstra que é um clássico porque caracteriza e individualiza seus prédios. Além disso, é como se retomasse o repertório de Pampulha”. O Copan, dos anos 50, é outra obra marcadamente niemayerana aos olhos do professor. “O interessante é que o Copan tem a forma de um S, sendo construído em uma cidade que chama São Paulo”. O Copan e o Ibirapuera foram encomendados para o quarto centenário da cidade. Para do Valle, a obra que menos representa o estilo Niemeyer em São Paulo é o Sambódromo. “Alí ele não faz nenhuma inovação, ao contrário do Sambódromo do Rio de Janeiro, o primeiro da história da arquitetura, no qual ele concebeu uma Praça da Apoteose”, afirma o professor.     

De ascendência judaica, o arquiteto tinha um médico na família: o renomado cirurgião Paulo Niemeyer. Nascido em 1907, Oscar Niemeyer tem um volume de obras tão monumental quanto numerosa. Do complexo da Pampulha, em Belo Horizonte, passando pela faraônica Brasília, até o pavilhão desmontável de modestos 250 metros quadrados, instalado em frente à Serpentine Gallery, no Hyde Park de Londres em 2004, são centenas de projetos. Há ainda um sem fim deles que não saíram do papel, destino que o auditório do Ibirapuera escapou por pouco. Ele tem obras na Alemanha, Estados Unidos, França, Itália, Noruega, Líbano, Rússia e Inglaterra.

Do Valle considera a arquitetura de Niemeyer mais leve e feminina que a de Le Corbusier, embora ele tenha bebido nessa fonte. “Quando fez o complexo da Pampulha, Niemeyer ainda não conhecia a Europa. Na verdade, ele nunca embarcou na de ninguém”. O rótulo de modernista também é contestado por Valle, para quem Niemeyer vai além, apontando o Palácio Mondadori, em Milão, como um clássico da arquitetura e prova de que ele explora outras vertentes. “Nas colunas do Mondadori e nos arcos, tão presentes na arquitetura romana, ele aproximou-se e absorveu o imaginário dos italianos”.  

O Museu de Arte de Niterói, de 1994 e o Museu Oscar Niemeyer em Curitiba, de 2002, são dois marcos da ousadia do arquiteto no Brasil, ambos com uma base menor que o volume superior. Também está em desenvolvimento, o Caminho Niemeyer, conjunto de pequenas construções espalhadas por três quilômetros na orla de Niterói, compostas por teatro, museu, praças e igrejas.


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