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EDITORIAL
A Saúde no Brasil. Como evitar os constantes "apagões" no setor?


ENTREVISTA
Antonio Carlos Lopes faz um RX da Residência Médica no país


ATIVIDADES DO CREMESP 1
Exame para recém-formados em Medicina: é hora de começar a discussão sobre o ensino médico no país


EDUCAÇÃO MÉDICA CONTINUADA
Módulos de Educação Médica Continuada agora podem ser acessados pela internet


ATIVIDADES DO CREMESP 2
Acompanhe os temas abordados no Encontro Nacional dos CRMs, realizado em Brasília


MOVIMENTO MÉDICO
Oficinas de trabalho preparam questões para o próximo ENEM


ATIVIDADES DO CREMESP 3
Encontrar respostas... este foi o maior desafio do II Congresso Paulista de Ética Médica


ATUALIZAÇÃO
Hepatite C: 3 a 4 milhões de brasileiros estão infectados


GERAL 1
Moacyr Scliar abrilhanta evento que homenageou as médicas do Estado


GERAL 2
Em destaque, a posse da nova diretoria da Sociedade Brasileira de Radiologia


ACONTECEU
Confira a participação do Cremesp em eventos relevantes para a classe


ALERTA ÉTICO
Dúvidas relacionadas ao plantão? Veja respostas a duas perguntas comuns...


GERAL 3
Financiamento p/o setor da Saúde é pauta de reunião na Câmara


HISTÓRIA
Complexo Hospitalar do Mandaqui: considerado um centro de formação médica


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Edição 236 - 04/2007

ATIVIDADES DO CREMESP 3

Encontrar respostas... este foi o maior desafio do II Congresso Paulista de Ética Médica


CONGRESSO DE ÉTICA MÉDICA

De que forma intensivistas e cirurgiões que atuam em atendimento de urgência e emergência combinam demandas sob extrema pressão a dilemas éticos do dia-a-dia? É possível empregar justa alocação de recursos, frente ao crescente número de ações judiciais voltadas à obtenção de medicamentos de alto custo?

Encontrar respostas para tais questões foi um dos desafios propostos aos palestrantes e à platéia de cerca de 300 pessoas presentes ao II Congresso Paulista de Ética Médica do Cremesp, realizado nos dias 30 e 31 de março, em São Paulo. Os trabalhos foram abertos pelo presidente do Cremesp, Desiré Carlos Callegari, que garantiu: as conclusões obtidas no encontro serviriam como “subsídio para nortear futuras decisões de natureza ética”, formuladas pela entidade.

As mesas de debates tiveram a participação de Eduardo Juan Troster, coordenador do CTI-Pediátrico do Instituto da Criança, do HC; Norberto Antônio Freddi, presidente do Departamento de Pediatria da Associação de Medicina Intensiva Brasileira/AMIB; Mário Roberto Hirschheimer, intensivista pediátrico; Marcelo Semer, juiz e mestre em Direito Penal pela USP; Maria Cecília Marchese, coordenadora de Ciência e Tecnologia e Insumos Estratégicos em Saúde da Secretaria do Estado da Saúde; Dário Birolini, professor titular de Cirurgia do Trauma da Universidade de São Paulo; Renato Ferreira da Silva, conselheiro do Cremesp e professor do Departamento de Cirurgia da Famerp; e Samir Rasslan, professor titular do departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da USP. As mesas foram coordenadas pelos conselheiros do Cremesp Clóvis Francisco Constantino; Nacime Salomão Mansur e Isac Jorge Filho, respectivamente.

Dilemas éticos em Terapia Intensiva Infantil


Da esq. p/ a dir.: Eduardo Troster, Clóvis Constantino. Norberto Freddi e Roberto Hirschheimer

No primeiro debate, especialistas da área reuniram-se para abordar enfrentamentos aos Dilemas Éticos na Unidade de Terapia Intensiva Infantil. Eduardo Juan Troster trouxe dados alarmantes relativos a tratamentos considerados, por vezes, fúteis. Segundo ele, 90% das pessoas que morrem no Brasil, morrem sofrendo. Ele defende o emprego, em determinadas situações, de “cuidados paliativos exclusivos” com a anuência da família, já que os pais têm autonomia de decisão, no caso de pacientes pediátricos.

“É essencial deixar claro que o paciente não será abandonado. Se a cura não for possível, faremos tudo para manter o bem-estar da pessoa”, argumentou Troster. “No Brasil, quando erramos com crianças, erramos sempre para mais”. Em resposta a uma pergunta da platéia, Norberto Antônio Freddi – que, durante sua exposição, apresentou números sobre morte encefálica no Brasil –, enfatizou a importância de se obter consenso da equipe multidisciplinar quanto ao emprego de cuidados paliativos. “A partir do momento em que conseguimos fazer sobreviver recém-nascidos cada vez menores, a neonatologia sofreu grande mudança. Como será a relação desta criança com seus pais, se não sabemos com clareza, se os bebês terão seqüelas? Será que a família vai cuidar? Precisamos dividir decisões com companheiros”. Em sua palestra, Mário Roberto Hirschheimer completou o raciocínio. “Quando o doente pode se recuperar, nosso dever é preservar a vida. Quando não, nossa função se torna aliviar seu sofrimento”.

Mas o que leva os médicos a investir obstinadamente em tratamentos “fúteis”? Várias razões podem vir à tona, como explicou Hirschheimer. Incluem-se aspectos institucionais e jurídicos (medo de citação em processo por omissão de socorro) e, até, pura ganância, se o atendimento for prestado de forma particular. “O médico vai até o fim não por um ato de bondade e, sim, de covardia, para não ser processado”, concordou Troster.

“Nem se pode dizer que tal posição se baseia em princípios religiosos, já que o papa João Paulo II defendeu o direito de o paciente manter a dignidade na morte. Bem antes, Pio XII afirmou ser lícito, em situações extremas, suprimir a dor por meio de narcóticos, mesmo se isso limitar a vida”, disse Hirschheimer. Lembra ainda que o Talmud, estudado por judeus, permite oração  pela morte do doente, em casos de agonia extrema.


Já o conselheiro Reinaldo Ayer de Oliveira (foto), organizador do evento, enfatiza que em reuniões clínicas em oncologia, por exemplo, “as decisões tomadas na prática não diferem muito daquelas desejáveis à luz da Bioética”.


Qual é a melhor conduta?

Em depoimento, Mário Roberto Hirschheimer traçou interessante esboço sobre comportamentos a serem adotados por pediatras que atuam no estressante ambiente de UTI:

- Identifique as expectativas da família
- Encontre, na equipe multidisciplinar, o melhor interlocutor com a família
- Esclareça de forma racional detalhes sobre tratamento e prognóstico
- Considere a participação da criança em seu tratamento

Prepare-se:
- Conheça tudo sobre o paciente, começando pelo seu nome
- Converse com a família em ambiente privativo
- Apresente-se de modo conveniente (traje limpo, cabelo penteado)
- Não fale ao celular
- Evite expressões técnicas ou complicadas 

Medicamentos de alto custo e a Justiça

Estaria o país vivendo uma avalanche de ações judiciais para a dispensação de medicamentos de alto custo a alguns pacientes? Ao arcar com tais remédios, o Estado prejudica uma parcela de pacientes que dependem do SUS? Tais perguntas fizeram parte dos debates da mesa II do Congresso, Medicamentos de Alto Custo, Direito à Saúde e Judicialização.

Em sua fala, a representante da Secretaria de Estado da Saúde, Maria Cecília Marchese, defendeu que há, sim, prejuízos. Deu como exemplo o aumento de ações solicitando determinado tipo de insulina especial, caríssima, a um grupo restrito de diabéticos. “O sistema público se transformou em uma espécie de farmácia do sistema privado. Não sei se é isso que o Brasil pode e quer fazer”.

Por sua vez, o juiz Marcelo Semer ponderou corresponderem à minoria os advogados mal-intencionados e os médicos que se submetem a pressões escusas, ao prescrever drogas. “Não podemos tratar a perversão como presunção ou a exceção como regra”.

Explicou que, teoricamente, o judiciário não poderia intervir em políticas de saúde, já que não se trata de leis. Porém, argumentou, “ou o judiciário interfere na questão das políticas públicas, ou os administradores vão fazer o que for de seu interesse”.

Cirurgia: ética em urgência e emergência


Da esq. p/a dir.: Samir Rasslan, Renato Silva, Isac Jorge, Desiré Callegari e Dario Birolini
 

Na manhã de sábado, dia 31 de março, os debates do Congresso de Ética do Cremesp voltaram-se aos Aspectos Éticos no Atendimento de Urgência e Emergência em Cirurgia. Desta vez, a dinâmica escolhida pela organização diferiu da adotada em outras mesas: perguntas referentes ao tema eram lançadas aos palestrantes e platéia, dando margem ao debate de idéias e troca de experiências.

O primeiro a falar foi o cirurgião Dário Birolini, que destacou: apesar da boa vontade em cumprir os ditames do Código de Ética Médica, nem sempre isso é possível durante atendimentos de urgência e emergência. “Medicina é uma profissão em que não existe branco e preto e, sim, cinza. É claro que sabemos ser direito do médico não atender se as condições de trabalho não forem completamente adequadas. Porém, se chegarmos hoje ao PS do HC, vamos nos deparar com mais ou menos 40 pacientes nas macas. E o que faremos? Não atenderemos?”

Em resposta à questão “Os aspectos éticos são diferenciados quando do atendimento em urgência/emergência”, o também cirurgião Samir Rasslan considerou: “Não são diferentes em relação ao atendimento eletivo. Só que em emergência ‘pisamos em ovos’ e as conseqüências são mais graves”. E completou: “Quem trabalha em emergência é um herói. É mal-remunerado; mal-dormido; mal-alimentado e, em determinados locais, corre risco de morte”.

Da platéia, a conselheira Maria do Patrocínio Tenório Nunes questionou se as principais falhas observadas nesta modalidade de atendimento não se devem, na verdade, a uma inversão de posições. “Não deveriam ser os médicos mais experientes a atuar em urgência e emergência, em vez de os menos experientes, como acontece hoje?”, questionou.

Em relação à pergunta “sob o ponto de vista ético, como vê o problema de limitação de vagas em UTI a pacientes cirúrgicos atendidos em emergência”, Rasslan lembrou a tendência a excessos terapêuticos, por parte de uma geração de profissionais. “Vemos doentes de 97 anos, terminais, entubados e, mesmo assim, encaminhamos à diálise, quando começam a perder a função renal... É a coisa certa?”

O conselheiro Renato Ferreira da Silva, um dos palestrantes da mesa, finalizou o argumento: “há horas em que devemos passar aos nossos pacientes o exemplo do Papa: se for melhor morrer em casa, vamos morrer em casa”.

Consentimento livre e esclarecido

Durante os debates, a importância do consentimento livre e esclarecido foi tópico que não obteve consenso. Confira algumas das opiniões:

“Todo consentimento informado é revogável (...) É desumano fazer uma mãe assinar um termo concordando que nada mais seja tentado pelo filho dela. É preferível anotar nossa conduta só no prontuário”. (Eduardo Juan Troster)
“O consentimento informado é uma grande hipocrisia. É somente uma fantasia de legalidade, destinada a defender o médico”.
(Dário Birolini)

“Uma das obrigações do médico é informar. Informações claras presentes no termo de consentimento informado servem para a proteção do médico, mas, fundamentalmente, para a proteção do paciente”. (Renato Ferreira da Silva)

Opiniões

“Os pacientes vão ao ‘Dr. Web’ e, depois, chegam ao nosso consultório, ‘vomitando’ informações. Não se pode perder de vista que são os médicos os que têm as informações técnicas para fazer diagnósticos e prescrever tratamentos”. (Eduardo Troster)

“Pai e mãe são defensores de seus filhos, não seus proprietários. Portanto, cabe ao médico decidir sobre as técnicas e os melhores meios terapêuticos”. (Mário Roberto Hirschheimer)

“Quanto mais tecnologia dispormos, tanto mais devemos discutir dilemas de natureza ética. E é nisso que se resume a nossa crise existencial”. (Clóvis Francisco Constantino)

“O médico não tem condição de gerar recursos... Como vou gerar recursos e vagas em UTI?”. (Samir Rasslan)

“Estimativas apontam que crianças que passaram por grandes períodos de internação estão entre as principais vítimas de maus-tratos, pela falta de vínculo afetivo”. (Norberto A. Freddi)

“Este é o calcanhar de Aquiles periférico: medicamentos de exceção não podem ser equiparados com os do dia-a-dia. Mesmo assim, observamos professores de medicina tendo algum tipo de relação com a indústria”. (José Marques Filho)

“É estupidez nos basearmos principalmente em exames e errarmos por culpa deles”. (Dário Birolini)

“Vale o conceito de ética defendido pelo ex-governador Mário Covas: ter ética é tão raro que quem a tem é considerado esquisito... Ética é vista como uma espécie de xingamento e lembrada apenas quando a pessoa não a possui”. (Isac Jorge Filho)

“É claro que ninguém vai assumir um trabalho de risco destes (em urgência e emergência) porque gosta e, sim, porque precisa. E, às vezes, as decisões a serem tomadas afrontam violentamente o nosso Código”. (Cid Carvalhaes)


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