CAPA
EDITORIAL (pág. 2)
Mauro Gomes Aranha de Lima
ENTREVISTA (Pág. 3)
Gonzalo Vecina
INSTITUIÇÕES DE SAÚDE (pág.4)
Hanseníase
SAÚDE PÚBLICA (Pág. 5)
Abelhas africanas
SAÚDE SUPLEMENTAR (Pág. 6)
Honorários médicos
ASSISTÊNCIA À SAÚDE (Pág. 7)
Hospital Universitário
PLATAFORMAS MÉDICAS DIGITAIS (Págs. 8 e 9)
Aplicativos
LITERATURA MÉDICA - (Pág. 10)
Nova publicação
AGENDA DA PRESIDÊNCIA (Pág.11)
Inclusão social
EU MÉDICO (Pág. 12)
Manuel Mindlin Lafer
JOVENS MÉDICOS (Pág. 13)
RM
CONVOCAÇÕES (pág. 14)
Comunicados
BIOÉTICA (pág. 15)
União homoafetiva
GALERIA DE FOTOS
ENTREVISTA (Pág. 3)
Gonzalo Vecina
“Modelo de financiamento e gestão do SUS deve ser repensado”
“Com a regulação co-gerenciada entre municípios e Estados,
o princípio da integralidade do SUS seria alcançado”
“É preciso repensar o modelo de financiamento para termos um SUS universal e inclusivo”. Tendo como base essa premissa, o professor assistente da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, Gonzalo Vecina – que também já ocupou o cargo de secretário Municipal de Saúde de São Paulo, de presidente da Anvisa e de superintendente do Hospital Sírio Libanês – concedeu entrevista ao Jornal do Cremesp, na qual fala sobre os desafios no novo governo interino de Michel Temer na área da Saúde. Vecina discorre sobre o que considera como principais pontos a serem discutidos para um atendimento justo e humanitário dentro do Sistema Único de Saúde (SUS). Entre eles, está a questão do financiamento e da gestão, com a integração do sistema de consultas entre Estado e municípios e a criação de regiões de saúde, promovendo uma reestruturação do atendimento primário e hospitalar, com redistribuição de leitos para atendimentos de alta complexidade.
- Ao tomar posse, o ministro da Saúde, Ricardo Barros, afirmou que não há capacidade financeira suficiente que permita suprir todas as garantias constitucionais na área da saúde. A equidade no atendimento preconizada no SUS está em risco?
O ministro voltou atrás no que disse, mas nós vínhamos falando há muito tempo que um dos problemas mais sérios na saúde pública é a questão do sub-financiamento. Temos um gasto percentual em relação ao PIB semelhante ao de países europeus, porém o PIB per capita é muito menor (3 a 4 vezes). Enquanto nosso PIB per capita é de US$ 11 mil, desses países gira em torno de US$ 40 mil. Não dá para garantir o que a Constituição prevê com esse financiamento. A sociedade brasileira tem de decidir se quer financiar de maneira adequada o sistema universal. Somos uma democracia. O parlamento deve decidir o que vai e o que não vai ser pago para ter um sistema mais inclusivo. Do jeito que está, estamos excluindo uma parcela da população.
- O que deve ser priorizado ou reestruturado?
O que a sociedade quer? Espero que seja um SUS universal e inclusivo, mas, para isso, precisamos repensar o modelo de financiamento. Por exemplo, a política de renúncias fiscais e a integração entre a assistência médica pública e privada. Há uma desigualdade porque enquanto 50 milhões de pessoas concentram um gasto de R$ 2 mil per capita no sistema privado de saúde, no público, esse valor é de R$ 1 mil. Temos de encontrar uma forma de integrar os sistemas para que deixe de ocorrer a sobreposição dos dois, como ocorre hoje. Ter um sistema privado para quem quer fugir de filas e ter sofisticação (quartos individuais, por exemplo), e ter um SUS resolutivo e transparente para o restante da população. Mas não podemos construir um sistema para pobres e outro para ricos, não podemos aumentar a exclusão social. A ideia é aumentar a eficiência dos sistemas, integrando-os. O SUS poderá, por exemplo, continuar sendo o responsável pela área de alta complexidade, mas financiado pelo setor privado.
- O governo anunciou possíveis cortes em alguns programas como, por exemplo, o Farmácia Popular e o Samu. Qual o impacto social dessas medidas?
Existem duas farmácias populares. Para as que oferecem medicamentos gratuitos para hipertensão, diabetes e asma, o programa não pode acabar. Cerca de 20% da população sofre de hipertensão e 10% tem diabetes, e esses medicamentos entregues nas farmácias privadas são importantes para controlar essas doenças, que impactam em 35% da mortalidade no País. A outra farmácia, que vende remédio mais barato, é um programa mal executado e já deveria ter fechado. Já o Samu é algo crítico, é um salvador de vidas, mas temos de discutir o financiamento tripartite e a integração nos serviços voltados para atender demanda de urgência e emergência. Integrar bombeiros com Samu é uma medida que aumentaria a eficiência do sistema.
- Que tipo de medidas sugere para que o sistema funcione melhor?
A criação de regiões de saúde. Temos 5.600 municípios, e de 50% a 60% deles têm menos de 50 mil habitantes. Nesses locais não é necessário ter hospital ou determinadas especialidades. É preciso criar estruturas regionais que atendam áreas maiores que o município. Criar espaços intermunicipais de atendimento, consórcios geridos pelo Estado, por exemplo. Nesse sistema, 100% das consultas e procedimentos seriam agendadas nessas regiões por telefone ou computador diretamente das unidades de atenção primária. Hoje, o paciente marca ao mesmo tempo no Estado e no município, e não comparece a uma ou outra. Não existe integração na marcação de consulta. Então criaríamos um sistema de regulação do acesso a serviços especializados, sejam consultas, exames ou outros procedimentos que não estão na atenção primária, que é a porta de entrada do sistema. A regulação co-gerenciada entre municípios e Estados, com filas estruturadas, por meio de um conceito misto de ordem de chegada e protocolos, como as filas dos transplantes, permitiria saber o que estamos fazendo ou deixando de fazer e, com isso, o princípio da integralidade seria alcançado.
- Qual o maior desafio no que se refere à gestão do SUS?
Precisamos aumentar a eficiência na alocação dos recursos, que são escassos. E isso é um grande desafio para o modelo de assistência à saúde existente. Temos de fazer um acolhimento melhor na atenção básica. As UPAs e as AMAs não trazem o paciente para dentro do sistema. O atendimento é imediato e não tem continuidade, trata-se apenas o sintoma. É preciso aumentar a importância da atenção primária, tornando-a mais inclusiva. A UPA não foi feita para tratar, não era necessário criar esse equipamento. Temos que redirecionar esses recursos para a atenção básica.
- Temos a questão da falta de leitos em hospitais. Como equacionar essa questão com a carência de recursos?
É necessário repensar a rede hospitalar. Atualmente temos 6.200 hospitais. Desses, 50% tem menos de 50 leitos, isso são “não hospitais”. O hospital precisa ter tecnologia e UTI. Somente 5% dos leitos do SUS são leitos de tratamento intensivo, e 12%, na rede privada. Sem isso não há solução, pois a população está envelhecendo mais e as doenças são mais complexas. Lugares com menos de 50 leitos devem se transformar em casa de repouso e não hospital. De nada adianta ter um hospital sem estrutura, sem UTI, no qual não dá para atender um paciente grave. É melhor que o paciente vá para uma região de saúde apta a atendê-lo, senão é assinar uma sentença de morte.