CAPA
EDITORIAL (pág. 2)
Bráulio Luna Filho - Presidente do Cremesp
ENTREVISTA (pág. 3)
Francisco Lotufo Neto
ANUIDADE 2016 (pág. 4)
PF pode obter desconto
INSTITUIÇÕES DE SAÚDE (pág. 5)
Centro de Referência DST-Aids
PESQUISA (Pág 6 e 7)
Violência no Trabalho
DEMOGRAFIA MÉDICA - (Pág 8 e 9)
Médicos no Brasil
TRABALHO DO MÉDICO (Pág. 10)
Exame do Cremesp
PLENÁRIA (Pág 11)
Temática - Cannabis
EU MÉDICO (Pág. 12)
Danny Lescher
JOVENS MÉDICOS (Pág. 13)
Greve
CONVOCAÇÕES (pág. 14)
Editais
BIOÉTICA - (pág. 15)
Imigração
GALERIA DE FOTOS
EU MÉDICO (Pág. 12)
Danny Lescher
Fábrica de empatia
O psiquiatra Auro Danny Lescher é um dos fundadores
do Projeto Quixote, que atende crianças
em situação de risco
Lescher: olhar humanizado
“Talvez o Projeto Quixote seja uma fábrica de empatia”, assim define o médico psiquiatria Auro Danny Lescher, um dos fundadores do projeto, que atende crianças em situação de risco, por meio da arte e da cultura, além de proporcionar atendimento clínico, pedagógico e social.
Descendente de judeus, Lescher nasceu no bairro do Bom Retiro, em São Paulo, e, desde os seus primeiros passos, sempre lidou com o diferente. Primeiro filho e neto, ele nasceu com o pé esquerdo torto. Em sua trajetória para corrigir a má formação, foi levado ao ortopedista Bartolomeu Bartolomei. Dos médicos procurados na época, esse foi o único que sugeriu a colocação de uma botinha de gesso, que mês a mês fosse desentortando seu pé.
Por uma questão logística, ao invés de ir ao consultório do médico, Lescher começou a frequentar o Pavilhão Fernandinho, na Santa Casa, onde Bartolomei era professor. “Nesse lugar havia várias crianças sindrômicas, com deficiências e partes do corpo tortas também”, conta Lescher, que conseguiu corrigir a formação do seu pé. Porém, a mãe dele havia feito uma promessa que, se o filho fosse curado, todo ano realizaria uma festa no Fernandinho para todas as crianças, na semana do aniversário do filho.
Durante vários anos, o pequeno Lescher e sua mãe compravam lembrancinhas, doces e todo o material necessário para realizar a festa. “Imagine uma criança indo até aquele prédio antigo e gótico, subindo os andares pelos elevadores de ferro, para realizar uma festa para desconhecidos! Era um ritual que me marcou, primeiro pela aproximação com o diferente, fora da regra, o que me incluo. E, segundo, pela superação”, define o psiquiatra, que também considera esse o seu primeiro contato com a pobreza.
“Diferente”
Ele conta que se julgava uma criança “diferente”, ficava pelos cantos, sempre sério nas fotos das festas do seu aniversário. Por isso, desde os 11 anos de idade, Lescher faz terapia.
“Conforme fui crescendo, tive alguns poucos amigos e estudei na Sholem Aleichem, escola que me formou muito bem nas questões cultural e artística, pois mostrava muito da integração da cultura judaica com a brasileira”, conta. Antes de fazer Medicina, Lescher chegou a estudar Engenharia Civil, e prestar vestibular para Jornalismo e Psicologia.
A escolha pela Medicina se deu principalmente por todo esse contato que ele teve durante sua infância e adolescência, e pela vontade de ajudar as pessoas. Desde o início do curso, ele já planejava se especializar em Psiquiatria.
Formado pela Escola Paulista de Medicina (EPM- Unifesp), durante a Residência, na década de 1990, Lescher foi convidado a participar de um projeto de Psiquiatria Social em Santos, onde estava sendo fechado um grande manicômio. Ele lembra que o foco do projeto era desconstruí-lo. “Nessa época implantava-se uma política de Saúde Mental muito interessante, nos moldes do que são os atuais Centros de Atenção Psicossocial (Caps). Esse foi um grande modelo experimental da desconstrução de hospícios, para construção de ambulatórios”.
“Na época eu fazia pós-graduação em Filosofia e Estética na USP, o que me levou a ter a ideia de levar o teatro para o projeto em Santos”, conta Lescher, lembrando que, ao descer a serra em direção ao litoral, tinha a mesma sensação de quando subia os elevadores na Santa Casa. Ele criou o Grupo Biruta de Artes Cênicas com os pacientes do ambulatório, e convidava amigos e pessoas das artes para participar dos trabalhos. “Eu era o poeta da turma dos médicos”, define. Ali estava o embrião do que seria o Projeto Quixote, já com uma percepção de cidadão.
Quixote
“Há 20 anos, eu e mais alguns colegas nos juntamos, conseguimos apoio do reitor da Unifesp, alugamos uma casa e obtivemos financiamento do governo estadual, para iniciarmos nosso projeto”, explica.
No começo, muito do que era realizado estava relacionado a crianças que estavam nas ruas, envolvidas com drogas. “Nós nos aproximamos delas por meio da arte, da cultura e do conhecimento que possuímos da psique. Não é para ser um consultório, mas sim o que uma escola deveria ser”, resume o psiquiatra.
O Projeto Quixote – ONG inspirada no personagem romântico de Miguel de Cervantes – começou a ganhar prêmios de diversas associações, entre eles o Prêmio Criança, da Fundação Abrinq e o Prêmio Itaú-Unicef. “As premiações ajudam o projeto, mas eu sempre tive a visão de que esse trabalho é só o normal a ser feito, nada demais”, diz Lescher.
Atualmente, mais de 100 pessoas trabalham no projeto, que possui vários programas, como o “Refugiados Urbanos”, na região da Cracolândia, em São Paulo, dentre outros de cunho pedagógico, literário e de educação para o trabalho, que acompanham a criança durante muitos anos. Também são realizados atendimentos clínicos e psicoterapêuticos.
O grupo promove cursos, supervisões e orientações em diversas entidades voltadas ao atendimento a crianças, por todo o Brasil. “Antes eram apenas pessoas super especializadas que podiam participar disso, o que nós mudamos. Precisamos de gente com conhecimento, formação prática, mas, principalmente, olhar humanizado”, segundo Lescher.
Em convênio com a prefeitura, o Quixote possui um Caps, que atende jovens em situação de risco de drogas. O projeto tem o tripé no atendimento, na pesquisa e na formação.
No site do projeto (www. projetoquixote.org.br) é possível encontrar mais informações sobre os cursos e serviços da instituição, além de informações sobre como realizar doações.
Escrevendo contos
Além do projeto Quixote, Lescher também é escritor, algo que o atrai desde criança. “Eu sempre escrevi poesia. Venho estudando e participando de oficinas de leitura e de escrita, de uns 10 anos para cá”, conta. Ele recebeu um convite da revista Brasileiros, para escrever uma coluna quinzenal, chamada Seis Sentidos. “É um sonho que deu certo”, alegra-se o psiquiatra, que eventualmente escreve para o jornal Folha de S. Paulo e para a revista Trip.
Aos 53 anos, Lescher é casado com a pediatra Bettina, e tem três filhos, Theo, Ian e Nina. Aos fins de semana eles alugam sempre a mesma casa no litoral, para passar um tempo juntos e recarregar as energias.