CAPA
EDITORIAL
Contra os Cartões de Desconto
ENTREVISTA
Rafael Guerra
ARTIGOS
Infecção Hospitalar e Tecnologia & Humanização são os temas em destaque desta edição
MOBILIZAÇÃO
Política Médica e CPI dos Planos de Saúde
MOVIMENTO MÉDICO
Confira as propostas das Entidade Médicas para a Saúde
ESPECIAL 1
Resultados da fiscalização de 1.012 hospitais e prontos-socorros do Estado, realizada pelo Cremesp
GERAL 1
Destaque: capacitação dos membros de Comissões de Ética Médica
GERAL 2
Entre os destaques desta seção está a parceria firmada entre o Cremesp e o Idec
INTERNET
Confira as novidades dos sites Cremesp: institucional, Banco de Empregos Médicos e Bioética
AGENDA
Participação do Cremesp nos eventos mais importantes do mês
NOTAS 1
Telemedicina na Amazônia e Médicos Sem Fronteiras são os destaques da Seção
NOTAS 2
Celobar e o Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem
ESPECIAL 2
Seguro de Responsabilidade Civil nos Estados Unidos
GALERIA DE FOTOS
ARTIGOS
Infecção Hospitalar e Tecnologia & Humanização são os temas em destaque desta edição
A infecção hospitalar está na contramão da tecnologia médica
Carlos Magno Castelo Branco Fortaleza*
Em 1962, um eminente microbiologista britânico, sir McFarlane Burnett, anunciou a “virtual eliminação das doenças infecciosas como fator significativo na vida social”. Infelizmente, as décadas seguintes não corroboraram este otimismo. Novas infecções emergiram. Doenças consideradas “antigas” adquiriram nova relevância na saúde pública.
O problema da infecção hospitalar está na contramão da tecnologia médica. A disseminação do suporte avançado de vida, as grandes cirurgias e o uso de drogas imunossupressoras e de antibióticos de amplo espectro contribuem para o aumento de sua incidência de morbidade. Torna-se, portanto, necessária uma constante reavaliação de seu impacto, seus fatores de risco e estratégias de prevenção.
A própria conceituação de infecção hospitalar não está isenta de dificuldades. Em primeiro lugar, o termo é um “guarda-chuva” que abriga desde sutis complicações infecciosas de uma punção venosa até complexas sepses fúngicas em indivíduos transplantados. Pneumonias, infecções de sítio cirúrgico e urinárias são entidades clínicas distintas quanto à prevenção, conduta e prognóstico. Por outro lado, as modalidades de atendimento médico há muito não se restringem ao ambiente hospitalar. Que dizer de infecções adquiridas em clínicas de diálise, hospitais-dia, home-care e instituições de longa permanência?
Tecnicamente, as infecções hospitalares podem ser vistas como o produto de uma falha no processo de assistência à saúde. Elas têm custos humanos e financeiros. Um estudo multicêntrico norte-americano estimou a ocorrência de 88.000 óbitos/ano em conseqüência da infecção hospitalar. O custo anual desse problema é da ordem de 4,5 bilhões de dólares. Uma única pneumonia hospitalar custa em média 5.683 dólares e é responsável por 5,9 diárias extras. O mesmo estudo demonstrou que a presença de Comissões de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) pode reduzir em 32,55% a incidência de complicações infecciosas durante a internação.
No Brasil, a Portaria do Ministério da Saúde 2.616 de 1998 determina a obrigatoriedade da existência de CCIHs formalmente nomeadas. Apesar disso, um levantamento feito em 2001 pelos Centros de Vigilância Epidemiológica (CVE) e Sanitária (CVS) da Secretaria de Saúde demonstrou que apenas 69% dos hospitais cumpriam essa exigência. O problema era mais grave em serviços com menos de 50 leitos (46%), enquanto 100% dos grandes hospitais (com mais de 300 leitos) possuíam comissões.
Preocupa-nos a possibilidade de que muitas CCIH existam apenas oficialmente. A inexistência de um Programa de Controle de Infecção Hospitalar (definido como conjunto de ações sistemáticas que têm a finalidade de reduzir a incidência e a gravidade das infecções) é certamente um grave problema em nossos hospitais.
O Centro de Vigilância Epidemiológica definiu como meta a presença de CCIHs atuantes em 95% dos hospitais dentro de 2 anos. Para atingir esse objetivo, um conjunto de estratégias de capacitação, acompanhamento de programas e fiscalização ativa está sendo planejado.
As ações de combate à infecção hospitalar podem ser muito simples (como a lavagem ou higienização das mãos) ou envolver técnicas e dispositivos de alta complexidade. Um fato, porém, é universal, a prevenção e o controle dependem de sensibilização e mobilização dos profissionais. A atenção humanizada ao paciente é parte desse processo. Garantir essa atenção é um importante avanço em uma luta árdua, mas compensadora.
* Carlos é diretor técnico do Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo
Tecnologia e humanização
José Goldenberg*
É notório o contínuo progresso dos meios diagnósticos e terapêuticos na área da medicina decorrente do desenvolvimento científico e tecnológico. Por outro lado, assistimos muitas vezes a fragmentação do paciente, ou seja, do ser humano, de acordo com as várias especialidades médicas, aliás, hoje muito em voga. Ele deixa de ser analisado de uma forma holística e integrada.
Cada indivíduo que procura um médico é único e a singularidade de seu caso deve ser analisada cuidadosamente. A heterogeneidade psíquica dos pacientes tem de ser valorizada, pois muitas vezes tem importante participação no desencadeamento ou agravamento das enfermidades, podendo influir na sua evolução e nos resultados do tratamento. O paciente sempre tem que ser avaliado tendo em mente múltiplos aspectos, que incluem a prevenção, o diagnóstico e o tratamento com sua reabilitação e reintegração ao meio social. Não se pode, entretanto, ignorar os impactos sociais e financeiros dos custos médicos crescentes para o paciente, família, empresa e a sociedade.
Sem qualquer dúvida, os avanços da Medicina trouxeram inquestionáveis benefícios para a humanidade, ultrapassando todas as expectativas de nossos antecessores. Infelizmente, porém, apesar de todas as conquistas científicas, vários fatores têm se interposto na relação entre o médico e o paciente. Um dos principais problemas são as limitações impostas por algumas fontes pagadoras que, ao remunerar mal o médico, obriga-o a atender muitos pacientes em tempo limitado, para obter um rendimento mínimo que o permita levar uma vida digna. Por outro lado, o paciente freqüentemente escolhe o especialista nas listas de credenciados de seu convênio, mal conhecendo o seu nome, não levando em consideração sua capacitação técnica e experiência, mas a proximidade de seu consultório do local de trabalho ou de sua casa. É claro que essa situação tende a provocar uma desarmonia na relação médico-paciente, que muitas vezes resulta em ruptura da confiança, elemento essencial nas relações humanas.
O médico em diversos casos passa a cuidar somente da doença e não do doente e, conseqüentemente, o ato médico é substituído pela máquina que se interpõe entre ambos. Esse caminho é inaceitável e deve ser rapidamente revertido.
O profissional deve realizar em todos os pacientes o ato médico regulamentado pelo Conselho Federal de Medicina. Precisa fazer a anamnese completa, conhecer os antecedentes pessoais e familiares, incluindo o psicológico, em seguida fazer um interrogatório específico a respeito dos vários órgãos e o exame físico completo – e o específico quando necessário. As informações obtidas com este levantamento são básicas para feitura do raciocínio clínico, que obrigatoriamente deverá ser explicado ao paciente, permitindo a realização de 70 a 80% dos diagnósticos, além de se constituírem no início do planejamento terapêutico. O próximo passo é a solicitação criteriosa dos exames subsidiários. A tecnologia tem presença essencial na Medicina moderna, devendo, entretanto, ser indicada zelosa e criteriosamente.
Após a adoção de todas as medidas necessárias, a decisão final da conduta deve ser baseada nas melhores evidências científicas disponíveis e na experiência pessoal do médico. Ele deve atuar com toda a cautela procurando buscar sempre a melhor eficiência e efetividade possível, em benefício do paciente. Além disso, o médico tem que, obrigatoriamente, respeitar a vontade do paciente.
Em conclusão, o médico deve ser o ator principal no gerenciamento da saúde do paciente, transmitindo ao mesmo confiança e fornecendo assistência integral àquele que sofre.
* Goldenberg é clínico, reumatologista e professor livre docente da Universidade Federal de São Paulo/EPM