CAPA
EDITORIAL (JC pág. 2)
Renato Azevedo Júnior - Presidente do Cremesp
ENTREVISTA (pág. 3)
José Gomes Temporão
ÉTICA (pág.4)
Publicidade Médica - Conselho Federal de Medicina
SAÚDE SUPLEMENTAR 1 (pág. 5)
Cartões de desconto
ONCOLOGIA (pág. 6)
Estimativa 2012 — Incidência de Câncer no Brasil
SAÚDE SUPLEMENTAR 2 (pág. 7)
Planos de Saúde, ANS e autonomia profissional do médico
DEMOGRAFIA MÉDICA (págs. 8 e 9)
A distribuição de médicos no interior paulista
SAÚDE MATERNA (pág. 10)
Medida provisória institui cadastramento nacional das gestantes
ESPECIALIDADES (pág. 11)
III Fórum Nacional de Especialidades Médicas
CFM (pág. 12)
EC 29: esperança frustrada
ESCOLAS MÉDICAS (pág. 13)
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
SAÚDE PÚBLICA (pág. 15)
MS define parâmetros para troca de próteses mamárias
BIOÉTICA (pág. 16)
Sigilo profissional
GALERIA DE FOTOS
ENTREVISTA (pág. 3)
José Gomes Temporão
“O SUS está num processo lento de degradação”
“Não reduziremos a mortalidade materna sem uma condição segura para as mulheres, especialmente as mais carentes”
Crítico do que considera uma “americanização” do Sistema Único de Saúde (SUS), o ex-ministro da saúde (gestão Lula) e atual diretor-executivo do Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde (Isags), José Gomes Temporão, avalia que o Brasil enfrenta um lento processo de degradação do sistema público e fortalecimento do privado. Para ele, há um paradoxo do governo no orçamento da saúde pública com a promoção da renúncia fiscal. E, ainda, que esse subfinanciamento crônico está por trás dos principais problemas do SUS. O médico sanitarista e ex-presidente do Inca também é enfático no que diz respeito às políticas de enfrentamento do alcoolismo, defendendo a punição ao motorista embriagado e o fim da propaganda de bebida.
O doutor tem declarado que o SUS brasileiro é muito bem visto internacionalmente. Mas por que a saúde é um item tão mal avaliado pela população brasileira?
Participei de uma reunião em Londres sobre saúde pública, em 2009, em que, após ouvir relatos de ministros da saúde do mundo inteiro, o epidemiologista, pesquisador e professor da Universidade de Londres, Michael Marmot, recomendou: “aprendam português e olhem para o Brasil”. Ele se referia aos resultados que apresentamos: um sistema universal de saúde com abrangência superior a 75% da população, único país com cobertura universal para portadores de HIV e o segundo em transplantes realizados (atrás apenas dos Estados Unidos), um programa de Saúde da Família para 100 milhões de cidadãos e aumento da expectativa de vida. Estudo em profundidade consolidado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pinad) 2009, com 300 mil pessoas, mostrou que 85% delas avaliaram como bom o atendimento recebido nos últimos 15 dias no SUS. Mas o que acaba aparecendo são pesquisas de rua sobre o que o cidadão acha da saúde brasileira e ele responde influenciado pela visão negativa retratada pela mídia.
Também é sua a afirmação que o Brasil passa por um processo de “americanização do SUS”. Em que sentido?
O sistema de saúde dos Estados Unidos é um dos piores do mundo, apesar da reforma proposta pelo presidente Obama. Lá a saúde é mercadoria, enquanto no Brasil é direito. Estamos num processo lento e gradual de degradação do SUS. Há um paradoxo na saúde pública: ao mesmo tempo em que o governo diz que é prioridade, subsidia a renúncia fiscal (com abatimento de imposto de renda de pessoas física e jurídica). Esses tributos deixam de ser aplicados na saúde, levando a classe média aos planos privados.
Qual é o maior problema que se enfrenta no governo para a condução do SUS?
O subfinanciamento crônico está por trás de tudo: da percepção ruim da população sobre o tempo de atendimento, da falta de médicos nas regiões Norte e Nordeste etc. E os especialistas em saúde sabem que apenas uma “melhor gestão” não adianta. Há uma fragilização do sistema público e fortalecimento do privado.
O Senado rejeitou a destinação de 10% da receita corrente bruta da União para o SUS. Como avalia o desfecho da Emenda 29?
Teve um avanço, no sentido de que as prefeituras e os Estados não poderão maquiar as verbas utilizando-as para outras atividades que eram atribuídas à área da saúde. Mas também há uma frustração sobre a possibilidade de destinação de mais recursos para o SUS.
Por que isso aconteceu?
Houve uma perda de hegemonia do movimento sanitarista, o mesmo que conseguiu universalizar o direito à saúde, e também de poder político da bancada de médicos e defensores do sistema. Entidades como os CRMs e CFM e outros profissionais da saúde lutaram, mas não foi suficiente. Se houvesse um movimento da sociedade civil e dos sindicatos de trabalhadores para a aprovação de mais verbas para a saúde, talvez o resultado fosse outro.
Quando ministro, o doutor defendeu a restrição da propaganda de bebida alcoólica e o aborto como questões de saúde pública. Por que esses temas não avançam?
Está havendo uma maior conscientização da população, nos últimos três anos, sobre os problemas relacionados à bebida e à Lei Seca. É um avanço, embora alguns Estados ainda não assumam o te¬ma como questão de importância da saúde pública. Defendo a radicalização, propondo que o motorista que dirigir embriagado, e cujo acidente cause vítimas, seja preso e aguarde julgamento na cadeia. É uma medida didática e punitiva, como acontece nos Estados Unidos e Inglaterra. Há interesses econômicos das emissoras de TV, que faturam bilhões com a propaganda, e até a Seleção Brasileira de Futebol é patrocinada pela indústria de bebidas, para vergonha nacional. A propaganda é um dos fatores responsáveis pelo estímulo ao consumo irresponsável, principalmente entre jovens e crianças. E o problema do álcool é mais grave que o do crack porque degrada a vida lentamente. Já o aborto foi descriminalizado em países de tradição religiosa tão forte quanto o Brasil, como Portugal, Uruguai e Argentina. Aqui não há discussão nacional sobre o tema. Mas não se reduzirá a mortalidade materna sem uma condição segura para as mulheres, especialmente as mais carentes, que adotam métodos abortivos, que levam à infecção, mutilação ou morte. A Igreja tem uma posição de misoginia, com seu machismo arraigado. Há uma confusão entre descriminalizar e ser favorável ao aborto.
Quais são os progressos obtidos pelo Isags em sua proposta de intercâmbio do conhecimento sobre a gestão em saúde?
O Isags tem sede permanente no Rio de Janeiro e é financiado com recursos de 12 países sul-americanos. É uma experiência com troca de informações e construção conjunta de políticas para sistemas universais, determinantes sociais, redes de vigilância para doenças infectocontagiosas e crônicas, acesso universal a medicamentos e recursos humanos para a saúde. Publicaremos dois livros com um panorama da saúde e do sistema de vigilância no continente e, a partir daí, trocaremos experiências.