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PARECER Órgão: Conselho Regional de Medicina do Estado de S�o Paulo
Número: 101660 Data Emissão: 25-05-2010
Ementa: A carência de médicos pediatras no mercado de trabalho tem múltiplas razões que estão bem esclarecidas no texto elaborado pela Sociedade de Pediatria de São Paulo e subscrito pela Câmara Técnica de Pediatria do CREMESP.

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Consulta    nº  101.660/09

Assunto:  Acerca das razões para a drástica carência de médicos pediatras no mercado de trabalho.

Relator:  Conselheiro Clóvis Francisco Constantino.

Ementa:  A carência de médicos pediatras no mercado de trabalho tem múltiplas razões que estão bem esclarecidas no texto elaborado pela Sociedade de Pediatria de São Paulo e subscrito pela Câmara Técnica de Pediatria do CREMESP.


O consulente, Deputado Estadual Dr. F. F., Presidente da Comissão de Saúde e Higiene da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo indaga o porquê da drástica carência de médicos pediatras no mercado de trabalho.

A consulta foi encaminhada à Câmara Técnica de Pediatria do CREMESP que, por sua vez, solicitou da Sociedade de Pediatria de São Paulo a sua análise.

Referida análise foi apresentada, discutida e aprovada em reunião da Câmara Técnica ocorrida em 03.05.2010; sendo, a seguir reproduzida na íntegra e passa a ser a resposta do CREMESP ao consulente.


PARECER

Em atenção ao vosso Ofício CSH - nº 023/2009, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo e a Sociedade de Pediatria de São Paulo vem a se manifestar como segue:

O médico pediatra é, antes de tudo, um orientador com a responsabilidade de qualificar o desenvolvimento de um adulto capaz numa sociedade que se pretende ser mais justa. A realização desta tarefa exige competência, compromisso, lealdade, disponibilidade, vontade e tempo.

É dos poucos profissionais que atuam em todos os níveis de atenção à saúde: promoção, proteção e recuperação da saúde e do processo de desenvolvimento com intervenções educativas, preventivas, diagnósticas e terapêuticas. No atendimento pediátrico devem ser levados em conta aspectos como estado nutricional, história alimentar, curva de crescimento, desenvolvimento neuropsicomotor, situação vacinal, acuidade visual e auditiva, saúde bucal, qualidade e quantidade de sono, entre outros parâmetros de saúde e desenvolvimento.

A relação médico-paciente adquire peculiaridade e intensidade diferentes na área da Pediatria. Ela é uma das especialidades médicas em que mais a afetividade e a empatia são determinantes importantes para o sucesso do tratamento. Daí uma assistência segmentada, supervisionada por diversos elementos, não ser o ideal, exatamente porque afeta um elemento essencial - a confiança. Confiança, entretanto, não se impõe, se conquista!

Um atendimento pediátrico adequado significa, obrigatoriamente, que o binômio paciente-família foi impactado de maneira positiva neste relacionamento profissional-pessoal. Quando qualquer uma das partes deste binômio não foi satisfeita em suas necessidades haverá uma ruptura das condições ideais de tal maneira que este desequilíbrio repercutirá no todo. Exemplos práticos: não adianta a criança ser bem examinada e receber uma prescrição adequada, se a mãe não assimilou o conteúdo da informação, ou não teve a sua ansiedade amenizada por uma palavra esclarecedora, ou se aquela receita efetivamente não for aplicada, seja por falta de recursos financeiros da família ou porque o sistema de saúde não garantiu essa oferta. Pais imaturos, ansiosos, agressivos, precisam ser "trabalhados" para que esse comportamento não repercuta negativamente na saúde do filho.

No atendimento das emergências e urgências pediátricas, o pediatra requer uma qualificação para atender inúmeras demandas e ser capaz de entender bastante (não tudo) de todas (ou muitas) as áreas da medicina, que lhe permite transitar com facilidade e qualidade, pelas enfermidades mais freqüentes, resolvendo a grande maioria dos casos de modo adequado, ágil, mas sem pressa. Isto requer vigor físico e equilíbrio emocional.

Considerando que a definição rigorosa do que vem a ser urgência e emergência é bastante difícil e a demanda de atenção no Pronto Socorro abrange também pacientes que não encontram acolhimento em outros serviços (ambulatórios, unidades básicas, etc.) com queixas crônicas e sociais, é necessário que o pediatra proceda à análise criteriosa e utilize bom senso para reconhecer o grau de severidade que envolve cada situação. O conceito de urgência e emergência difere entre profissionais da saúde e pacientes. Em grande número, a urgência é a ansiedade da família. É esta que tem que ser entendida e atendida com muita paciência e sensibilidade.

A Pediatria é uma atividade médica específica, com várias componentes que a diferenciam, particularmente no cuidado com o ser humano na fase em que está em crescimento e desenvolvimento, com toda a repercussão na sua qualidade de vida adulta.

A qualificação de um pediatra é, portanto, uma tarefa de enorme responsabilidade, que não vem sendo contemplada pela sociedade com uma recompensa proporcional ao esforço requerido. Sequer é considerado o significativo ganho econômico para os sistemas de saúde, pois o bom atendimento pediátrico acarreta redução de internações hospitalares e da utilização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos, com grande economia de recursos financeiros, e representa, acima de tudo, um avanço imensurável na qualidade de vida da infância, da adolescência e, consequentemente, da população em idade produtiva da sociedade brasileira.

Feminilização da atividade

Atualmente 80% das vagas nas residências médicas de pediatria são ocupadas por mulheres. Estas, conscientes da importância da mãe no crescimento e desenvolvimento de uma criança, limitam suas atividades ao terem seus próprios filhos. Passam a não dar plantões e a trabalhar em atividades de tempo parcial para poderem se dedicar a eles.

"Pronto-socorrização" do atendimento

Com a incorporação da mulher no mercado de trabalho na sociedade contemporânea, o Pronto Socorro passou a ser utilizado como um serviço de conveniência para as famílias. Lá não se requer a marcação de consultas e há a expectativa de um atendimento ágil e resolutivo. Tais famílias não levam em consideração que num Pronto Socorro não ocorre um atendimento pediátrico adequado, pois é um tipo de serviço para reconhecimento e tratamento de uma condição clínica e não para um atendimento pediátrico integral. Não há compromisso de quaisquer das partes entre si, que termina com o final do atendimento. Aliado ao sacrifício de ter de trabalhar nas madrugadas, finais de semana e feriados e à insegurança em muitos locais de trabalho, tal não compromisso vem contribuindo para uma progressiva frustração profissional, afastando muitos pediatras da especialidade.

Exigência de produtividade

O atendimento pediátrico é realizado em várias etapas para contemplar a abrangência de sua ação: diagnóstico, promoção da saúde, prevenção de doenças, tratamentos e orientações. Como fazer tudo isso, sem esquecer de trocar o lençol da maca e lavar bem as mãos entre uma consulta e outra, mantendo a produtividade exigida na maioria dos serviços de, pelo menos, quatro atendimentos por hora (ou até 15 minutos por atendimento)? A frustração de não conseguir fazer o que deve para cumprir seu dever tem afastado muitos médicos desta área de atividade. Acrescente-se a isso que o pagador dos serviços, quase nunca o usuário (paciente e sua família) sequer está preocupado com a qualidade e resolutividade de tal atividade, desde que a produtividade, medida somente pelo número de atendimentos realizados, seja atingida!

Evidências da diminuição do interesse pela pediatria

Deve-se ressaltar que a pediatria continua sendo uma das maiores especialidades médicas. Estima-se que no Brasil existam hoje cerca de 36.000 pediatras. Entretanto o histograma abaixo mostra, de 1997 a 2009, a progressão da procura da pediatria pelos formandos em Medicina. De 1997 a 1999 houve um aumento, mas a partir de então houve uma queda de 50% dos candidatos ao Título de Especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria e de 55% daqueles considerados qualificados para tal (aprovados no concurso), mostrando, inclusive, uma piora na qualificação para o exercício desta especialidade. Ressalte-se que neste período houve um significativo aumento de formandos em medicina pela abertura indiscriminada de faculdades de medicina por todo o país.

Remuneração justa do profissional médico

Para atender adequadamente um paciente, o médico necessita ter uma qualidade de vida para evitar que ele leve seus problemas pessoais para o trabalho. Uma melhora na remuneração dos médicos reduziria a prática de trabalhar em vários hospitais para aumentar o orçamento, pois essa forma de trabalho acaba esgotando o médico e reflete-se no tratamento dos pacientes, não podendo o médico estudar para se atualizar e oferecer um bom atendimento.

O novo Código de Ética Médica, em vigor desde 13 de abril de 2010, no seu:

CAPÍTULO I

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS 

III - Para exercer a Medicina com honra e dignidade, o médico necessita ter boas condições de trabalho e ser remunerado de forma justa .

 XV - O médico será solidário com os movimentos de defesa da dignidade profissional, seja por remuneração digna e justa seja por condições de trabalho compatíveis com o exercício ético-profissional da Medicina e seu aprimoramento técnico-científico".

Uma das razões para a atual situação de falta de pediatras é a ausência de uma política responsável de recursos humanos que seja aplicada aos médicos do serviço público.
É oportuno comentar que vem ocorrendo um aumento da oferta de empregos para pediatras em virtude da necessária implantação de unidades de terapia intensiva (UTIs) neonatais e pediátricas, considerando a ainda carente oferta destas modalidades de assistência à população.
O que vem acontecendo é um fenômeno de mercado de trabalho, relacionado principalmente à remuneração dos profissionais. Como não existem procedimentos que acrescentem remuneração ao atendimento pediátrico, uma vez que a pediatria é essencialmente uma especialidade clínica, outras áreas têm atraído os jovens médicos. Isso denota a falta de visão do sistema de saúde com o atendimento primário e secundário. Não existe uma remuneração adequada e não se oferece condições dignas de trabalho. Não existe um plano de cargos e salários adequado na rede pública.

Em relação ao pediatra brasileiro, nota-se uma diminuição da auto-estima, trabalhando com baixos salários e em condições inadequadas.

Foi preciso acontecer uma carência de pediatras para preencher as vagas necessárias para um atendimento mínimo para o problema ser discutido e chamar a atenção dos responsáveis pelas políticas de saúde. A lei da oferta e da procura funcionou e hoje se procura pediatras nos serviços públicos e privados.

Embora a remuneração do pediatra tenha melhorado no último biênio, isto só ocorreu nos pronto-socorros e UTIs de serviços privados, absorvendo a quase totalidade dos profissionais que estão ingressando no mercado de trabalho. É preciso corrigir as deficiências atuais, inclusive a participação inadequada de outros profissionais no atendimento de crianças, ação que deve ser exclusiva da pediatria e dos pediatras. As crianças e os adolescentes, assim como seus pais, querem e precisam ser atendidos na sua integralidade por pediatras. As famílias reconhecem o trabalho dos pediatras e o dia-a-dia mostra que pediatras são médicos resolutivos, fundamentais para o bom resultado do sistema de saúde. A obrigação de todas as esferas de poder do país é garantir condições para que as nossas crianças tenham um atendimento adequado feito pelo pediatra. Não podemos perder a oportunidade de corrigir os fatores de desestimulo, remuneração injusta e condições de trabalho precárias.

Concurso aberto em 06/04/2010 na Defensoria Pública da União para selecionar candidatos para o cargo agente administrativo (exige nível médio) oferece uma remuneração de R$ 2.299,42.

Um agente penitenciário federal (exige nível médio), recebe um salário básico de R$ 3.254,04, acrescido de gratificação de desempenho no valor de R$ 976,00 (total R$ 4.230,04), por 40 horas semanais de trabalho e, nos casos aos quais se aplique o regime de trabalho por plantões, a jornada de trabalho recebe remuneração suplementar (edital de concurso de fevereiro de 2009).

Em abril de 2010, concurso público destinado a selecionar candidatos para o cargo de Defensor Público Federal de Segunda Categoria, oferece remuneração de R$ 14.549,23.

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região abriu inscrições em janeiro de 2010 para concurso público destinado a selecionar candidatos para juiz federal substituto, com remuneração de R$ 20.953,17.

A remuneração inicial para o médico no Hospital das Clínicas da FMUSP, para uma jornada de trabalho de 20 horas semanais é, em 2010, de R$ 1.559,24 (Padrão 1-A, da Estrutura de Vencimentos I, da Escala de Vencimentos da Área Saúde e gratificações).

Em fevereiro de 2010, o Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual (IAMSPE) abriu inscrições para selecionar candidatos a médico em regime de 20 horas semanais, com um salário de R$ 1.909,25, exigindo título de especialista na área de atuação (além dos 6 anos de faculdade de medicina, requer no mínimo mais 2 anos de residência médica).

Também em fevereiro de 2010 o Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo abriu inscrições para selecionar candidatos a médicos em regime de 20 horas semanais, com um salário de R$ 2.407,90, tendo como pré-requisito o título de especialista na aera de atuação.

A plenária Final do XI Encontro Nacional das Entidades Médicas - ENEM, em Junho 2007, recomendou um piso salarial de R$ 7.000,00 por 20 horas semanais de trabalho. Com a atualização pelo INPC, em janeiro de 2010, este valor seria de R$ 7.826,57 . Esta é a proposta do Projeto de Lei nº 3.734/2008, que altera a Lei nº 3.999/1961, sobre o salário-mínimo dos médicos e cirurgiões-dentistas. O piso incentiva que médicos talentosos desenvolvam e repassem conhecimentos adequados à realidade do país.

A criança brasileira tem o direito à assistência médica pública e eficaz assegurado pela Constituição Federal (Artigo 227), sendo dever do Estado prover os mecanismos para que os recursos direcionados à saúde sejam otimizados em seu benefício. Estabelecer vencimentos dignos para médicos do setor público faz parte desse dever, considerando que é mais econômico pagar um bom médico do que gastar ao remediar (1).

Este é o nosso parecer, s.m.j.

Conselheiro Clóvis Francisco Constantino


Colaboração dos Drs. Mário Lavorato e Dr. Milton Macedo, do Departamento de Defesa Profissional da SBP e do Prof. Dr. José Hugo de Lins Pessoa, ex-presidente da SPSP.

1.http://www.joildo.net/artigos/remuneracao-digna-para-medicos-do-sus/#ixzz0n5VJni3L


APROVADO NA 4.204ª REUNIÃO PLENÁRIA, REALIZADA EM 21.05.2010.
HOMOLOGADO NA 4.207ª REUNIÃO PLENÁRIA, REALIZADA EM 25.05.2010.

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