Consulta nº 16.815/01
Assunto: Comunicação do médico e do hospital diante da ocorrência de tentativa de aborto.
Relator: Olga Codorniz Campello - advogada
PARECER SUBSCRITO PELO CONSELHEIRO JOSÉ CÁSSIO DE MORAES
Ementa: Paciente menor - tentativa de aborto. Médico e hospital não devem comunicar o fato à autoridade policial ou judicial em face do segredo médico. Providências a ser tomadas pela instituição - comunicação aos responsáveis pela menor, a fim de que os mesmos tomem as providências cabíveis.
O consulente solicita parecer do CREMESP sobre comunicação do médico e do hospital diante da ocorrência de tentativa de aborto.
PARECER
Após as informações obtidas na consulta nº 24.292/00, o consulente Dr.J.M.C.O, solicita esclarecimentos sobre alguns pontos, quais sejam:
1- Se ocorreu aborto, vez que a paciente, menor de 14 (catorze) anos deu à luz a recém-nascido (680g), e o mesmo sobreviveu por aproximadamente 48 horas, sendo que a consulta nº 24.292/00, discorre sobre o crime de aborto.
Analisando o teor da consulta, verificamos que, embora a paciente menor tenha chegado ao hospital por ter ingerido comprimidos Cytotec, não há que se falar em crime de aborto, isto porque, para que este crime ocorra é necessário que o feto morra ainda no ventre materno. Se nascer com vida, ainda que por poucos minutos, o crime não é de aborto, e no caso em questão, o feto ainda sobreviveu por aproximadamente 48 (quarenta e oito) horas.
O que ficou evidenciado por ter a mãe ingerido comprimidos que provocam aborto, foi a intenção da mesma em provocar o aborto, mas este não ocorreu por circunstâncias alheias à sua vontade, ou seja, porque a mesma foi socorrida à tempo.
Houve, portanto, tentativa do crime de aborto, pois o crime de aborto consuma-se, como já mencionado, com a morte do feto ou a destruição do produto da concepção.
2- Qual deve ser a atitude da instituição que tem conhecimento do fato, pelo atendimento médico? Solicita, também, o posicionamento deste E. Conselho, tendo em vista, que no caso foi lavrado o boletim de ocorrência pela Administração.
Neste tipo de crime, qual seja, o de aborto, mesmo na sua forma tentada, a conduta do sujeito lesa um interesse jurídico de tal importância, que a propositura da ação penal independe da vontade de qualquer pessoa. A autoridade policial tomando conhecimento dos fatos deve proceder de ofício.
Assim, qualquer pessoa que tenha conhecimento da ocorrência deste crime, poderá levar os fatos ao conhecimento da autoridade policial, para que possa ser feito um boletim de ocorrência, que posteriormente é remetido ao Ministério Público para a propositura da ação.
Trata-se da denominada ação penal pública incondicionada, ou seja, não depende do preenchimento de condições como ocorre na ação penal condicionada à representação ou à requisição.
No caso em pauta, como já mencionado na consulta nº 24.292/00, o médico que atendeu a paciente não pode levar os fatos ao conhecimento da autoridade policial, vez que estaria infringindo o segredo médico, cometendo assim conduta anti-ética.
Vale ressaltar que também a instituição não pode comunicar o fato à autoridade policial, sob o mesmo fundamento, qual seja, violação ao segredo médico, independente de se tratar de paciente menor.
Embora a Lei das Contravenções Penais, em seu art. 66, inciso II, disponha que o médico deva comunicar crime de ação pública de que teve conhecimento no exercício da medicina à autoridade policial, sob pena de responder por infração penal, ele estará desobrigado a fazê-lo, e conseqüentemente não terá cometido esta infração penal, se a comunicação expuser o cliente a procedimento criminal. No caso em pauta, o médico encontra-se acobertado pelo disposto neste artigo, uma vez que a comunicação daria ensejo a propositura de um processo criminal, por tentativa de crime de aborto contra a paciente.
Argüidos a respeito da postura da instituição frente aos fatos, entendemos que o médico que deu atendimento a paciente, bem como o hospital, não devem ter a iniciativa de levar os fatos à autoridade policial, e no caso, sendo a paciente menor, deve a instituição convocar seus responsáveis para que os mesmos tomem as medidas cabíveis.
É o nosso parecer, s.m.j.
São Paulo, 27 de Janeiro de 2003.
Olga Codorniz Campello
advogada
PARECER SUBSCRITO PELO CONSELHEIRO JOSÉ CÁSSIO DE MORAES
APROVADO NA 2.905ª REUNIÃO PLENÁRIA, REALIZADA EM 14.02.2003.
HOMOLOGADO NA 2.908ª REUNIÃO PLENÁRIA, REALIZADA EM 18.02.2003.
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