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Projeto põe alunos da USP em contato com a realidade da saúde da população


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Edição 186 - 02/2003

EXTENSÃO

Projeto põe alunos da USP em contato com a realidade da saúde da população


Projeto põe alunos da USP em contato com a realidade da saúde da população

Uma equipe composta por 91 pessoas, entre alunos, professores médicos e fisioterapeutas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) participaram, de 10 a 21 de dezembro de 2002, de um “mutirão” de atendimento à população da cidade de Serra dos Aimorés, na região Nordeste de Minas Gerais. A atividade, realizada pelo quinto ano consecutivo, durante o período de férias da Faculdade, integra o Projeto Bandeira Científica, iniciativa dos alunos.

De acordo com o coordenador do Projeto, Carlos Eduardo Corbett, foram realizadas consultas, palestras preventivas, além do fornecimento de medicamentos. “Há um avanço em cada edição do Bandeira, como priorizar o atendimento rural e dar um treinamento aos estudantes na questão da atenção primária em regiões com carência de serviços. Nessa expedição, atendemos uma parcela importante da população local, com os alunos tendo um tempo maior para cada atendimento”, ressaltou o coordenador.

Carência de serviços
Serra dos Aimorés tem cerca de 7.750 habitantes, fica a 650 km de Belo Horizonte, faz fronteira com os Estados de Espírito Santo e Bahia e é totalmente desprovida de serviços de saúde. O deslocamento até o único hospital público da região, na cidade vizinha de Nanuque, leva no mínimo 30 minutos.

A população é formada predominantemente por trabalhadores rurais, empregados nas grandes fazendas de pecuária e agricultura da região. Sem estrutura hospitalar ou médicos especialistas, a cidade conta, no entanto, com o Programa Saúde da Família. A visita dos alunos foi importante não só para atender e orientar os moradores, mas também contribuiu com a capacitação dos agentes de saúde locais.

Para Marcelo El Khouri, estudante do quinto ano de Medicina e um dos diretores do projeto, “nossa visita não é um acontecimento isolado, mas um complemento a um sistema que tem deficiências. O que fazemos é muito mais do que medicar. Também amparamos e tentamos conscientizar as pessoas de que é possível melhorar a qualidade de vida, mesmo diante de limitações”.

Muito trabalho
Durante 11 dias, a equipe da FMUSP realizou 2.100 consultas e 500 visitas domiciliares, com o apoio de profissionais da Faculdade de Medicina de Caratinga (Famec).

O atendimento ambulatorial foi realizado nas especialidades de Clínica Médica, Pediatria, Otorrinolaringologia, Cirurgia e Psiquiatria, além de exames de Citologia Cervical Uterina, para detecção de câncer de colo de útero, exame parasitológico de fezes, e biópsias para investigação de Leishmaniose, Hanseníase e câncer de pele. Houve, ainda, encaminhamento fisioterápico nos casos necessários. Os medicamentos utilizados também foram fornecidos pelo projeto.

Os pacientes atendidos já haviam sido previamente agendados pelos agentes de saúde locais. Os dados coletados em cada atendimento foram encaminhados à Secretaria de Saúde e poderão servir para análise das condições de saúde local. Além disso servirão de base de um estudo epidemiológico do Hospital da Clínicas da FMUSP. “Os dados analisados devem resultar num projeto de saúde, encomendado pelos prefeitos da região. Para os alunos, o fato de participarem da elaboração e discussão dos dados permite uma intimidade maior deles com a problemática da saúde no país”, disse Corbett.

Nos últimos dias, a equipe apresentou palestras aos agentes de saúde locais e abertas à população, abordando os temas DST-Aids, diabetes, hipertensão, saneamento, planejamento familiar e lombalgias.

Projeto foi criado em 1957
Esta foi a quinta edição do Projeto Bandeira Científica, recriado em 1998 por alunos da FMUSP e que funciona como atividade de extensão universitária. O Projeto remonta do ano de 1957 mas, devido à repressão do regime militar, foi suspenso em 1967. Os alunos, ao vasculharem registros antigos do Centro Acadêmico Oswaldo Cruz, encontraram relatos dessas primeiras experiências e decidiram reativá-lo com o apoio da FMUSP. Nos quatro anos anteriores, a expedição esteve nas cidades de Cajati e Eldorado, no interior do Estado de São Paulo; Monte Negro, em Rondônia e Buriticupu, no Maranhão.

“A experiência que adquirimos em contato com essa realidade, com os problemas de saúde da população, muda nossa forma de encarar a vida. Depois disso, quando estamos atendendo no HC, passamos a ver o paciente como um todo, não só em seu aspecto físico mas também seu ambiente familiar, cultural e social”, lembra Marcelo El Khouri, que também participou do projeto em anos anteriores.

Uma história de vida
Para ilustrar a experiência dos alunos, Marcelo conta um episódio vivido por eles em Serra dos Aimorés. Durante uma visita domiciliar, encontraram uma senhora com significativo comprometimento pulmonar, decorrente do hábito de fumar cachimbo durante 80 de seus mais de 90 anos de idade.

O costume, segundo ela, passado de geração em geração na sua família, era uma das poucas fontes de prazer em sua vida. “O que ela mais precisava não era de conselhos e de prescrições médicas, mas sim de um banheiro, de mínimas condições de saneamento para viver dignamente”, lembra Marcelo. “A carência e a precariedade eram comuns, mas cada caso tinha peculiaridades próprias, e exigia uma forma de atendimento médico distinta para cada um.

O médico, ou o estudante de Medicina, é obrigado a adaptar seu conhecimento a uma realidade na qual muitas vezes os problemas vão além dos males físicos”, completa o estudante, convicto de uma das mais importantes lições da Medicina.

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