Cremesp na Mídia
Enfim, descanse em paz
Aline Mustafa - 06/12/2010 - Diário de S. Paulo
Até que ponto vale a pena prolongar a vida de um paciente em estado terminal, sem chances de melhora ou cura? Familiares, muitas vezes, relutam em aceitar a morte já prevista, enquanto médicos alegam que não é digno insistir na sobrevida de um paciente à custa de dores e sofrimento.
Objetivo é preservar a dignidade do doente e, por consequência, amenizar o sofrimento da família. Ele continua a receber cuidados paliativos
Com base neste argumento, o Conselho Federal de Medicina (CFM) lutava para a legalização da ortotanásia, prática que prevê a suspensão de tratamentos invasivos que prolonguem a vida de pacientes em estado terminal e sem chances de cura. Na última semana, a Justiça Federal revogou a liminar que suspendia a regulamentação da ortotanásia no Brasil. Para a procuradora Luciana Loureiro Oliveira, a ortotanásia não constitui crime de homicídio, ao contrário da eutanásia.
Inevitável /O objetivo da ortotanásia é não prolongar o sofrimento. "Se a doença está em progressão, em fase avançada e a medicina não tem como evitá-la, a morte é inevitável. Não há como forçar alguém a viver eternamente", diz a geriatra e especialista em cuidados paliativos Ana Claudia Arantes, do Hospital Albert Einstein.
O paciente não é abandonado, segundo ela. Ele continua recebendo remédios para controle de dor, de falta de ar, hidratação e demais cuidados essenciais, no hospital ou em casa, se o quadro permitir. Entubação e manobras de ressuscitação não são mais usadas. "Ortotanásia significa permissão para a morte natural, para a pessoa falecer de forma digna".
A técnica contempla a ética médica, segundo o psiquiatra Mauro Aranha, diretor-secretário do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp). "O médico tem absoluto compromisso com a vida, mas também com a dignidade humana. Sabemos que há um momento em que não há mais onde investir".
Apesar de aceito, o tema provoca polêmica - quatro hospitais procurados pela reportagem não se manifestaram.
A decisão sobre a ortotanásia é tomada entre o médico, os familiares e o paciente
Covas e João Paulo 2 são exemplos de 'morte digna'
Covas criou lei sobre ortotanásia
O ex-governador de São Paulo Mário Covas é um dos principais exemplos de ortotanásia no Brasil. Covas teve um câncer reincidente na bexiga e optou por deixar o hospital. Ele passou os últimos dias de vida ao lado da família, em casa, recebendo cuidados paliativos, e morreu em 2001.
Dois anos antes, Covas havia sancionado a Lei estadual 10.241 , conhecida como Lei Mário Covas, que permite a suspensão de tratamentos que prolonguem a vida de pacientes em estado terminal ou sem chances de cura. A legislação garante ao paciente o direito de "recusar tratamentos dolorosos ou extraordinários para tentar prolongar a vida".
O papa João Paulo 2º também optou por suspender as intervenções para sua sobrevida e decidiu passar seus últimos dias em casa, no Palácio Apostólico, no Vaticano, recebendo medicações para dor. Ele sofria de artrite e Mal de Parkinson. A Igreja Católica considera a ortotanásia ética e a apoia.
ENTENDA A DIFERENÇA
Ortotanásia
Consiste em deixar de oferecer tratamentos invasivos (como entubação) para a doença
que afeta o paciente terminal.
Ele morrerá devido à evolução natural desta doença
Eutanásia
Trata-se de oferecer medicamentos ou procedimentos para induzir a morte rápida e indolor do paciente terminal. Não é legalizada no Brasil